Me deparei com um post que escrevi em meu aniversário de 29 anos e fiquei com vontade de postá-lo novamente, pois dois anos se passaram, mas continua sendo bastante atual para mim. Sei que deveria tê-lo publicado no dia 23 de janeiro, mas sinceramente…tanto faz. 🙂  faça de conta que hoje é 23 de janeiro, me deu vontade de publicar, até porque ele estava no blog antigo, que está ameaçado de extinção, já que vira e mexe penso em tirá-lo do ar.

29 anos

Aos 29 anos, minha mãe esperava o terceiro filho. Já meu pai, aos 29 anos, se preparava para o nascimento do quarto filho. Com 29 anos, o Davison me conheceu e começamos a namorar. Aos 29 anos, minha avó acabara de ter a quinta criança. Aos 29 anos, Sylvia Plath tentou o suicídio pela segunda vez. Augusto dos Anjos morreu aos 29 anos, assim como a cantora Dolores Duran.

O Arco do Triunfo demorou pouco mais de 29 anos para ser construído. John Nash teve sua esquizofrenia diagnosticada aos 29 anos. O casamento de Bach durou 29 anos. O reinado de Ezequias em Judá durou 29 anos. Também aos 29 anos Sidarta largou sua vida de príncipe para virar Buda e se transformar na estatueta gorducha e careca, a passar a eternidade em posição de lótus. A Guerra dos Trinta Anos, quem diria, durou apenas vinte e nove.

Um pouco menos importante (apenas um pouco) do que A Guerra dos Trinta anos, John Nash, Bach e o Arco do Triunfo, eu completo hoje, dia 23 de janeiro, 29 anos de idade. Bem acompanhada, já que, além de mim e do meu pai, também nasceram no dia 23 de janeiro o cineasta Eisenstein, a princesa Caroline de Mônaco e o pintor Manet, isso sem contar as milhares de outras pessoas que também devem compartilhar essa data conosco.

Algumas coisas, no entanto, se explicam…em 23 de janeiro de 1875 morreu o Marquês de Sapucaí…pois é, eu nasci comemorando a morte do sambódromo 🙂 deve ser por isso que detesto carnaval. Também não gosto do surrealismo, e Salvador Dali escolheu o dia do meu aniversário de nove anos para se despedir deste mundo. Espero que tenha ido em paz.

No dia 23 de janeiro aconteceram algumas coisas importantes, embora não tão importantes quanto o meu nascimento. Entre essas coisas, gostaria de destacar o desembarque da família real portuguesa na Bahia em 1808, fugindo de Napoleão, fato esse que obrigou a colônia a se transformar em algo mais civilizado, permitindo, inclusive, as primeiras impressões de livros -ou coisa que o valha, já prevendo que 192 anos depois, nasceria uma leitora voraz, que não conseguiria sobreviver sem um mercado editorial nacional decente. No dia 23 de janeiro de 1896, Wilhem Röntgen descobriu o raio X, para que, 98 anos depois, eu pudesse fazer a documentação ortodôntica necessária para colocar o aparelho fixo e, finalmente, consertar meus dentes.

No dia 23 de janeiro de 2009 senti como se fizesse aniversário pela primeira vez. Foram tantas mudanças no ano que se passou que tive vontade de comemorar, com bastante entusiasmo, esta data querida. O Davison levou isso tão a sério que arrumou uns balõezinhos coloridos, para enfeitar nossa sala…risos…teve bolo, vela, parabéns, pizza, pãezinhos com patê de ricota com tomates secos e suco natural de frutas vermelhas 🙂 Ele fez tudo (exceto o bolo e as velas, que vieram prontos), preparou a festa inteira para mim, me dando o maior presente do dia (depois eu lavei a louça…risos…pelo menos isso, né?).

Ganhei um livro, um ventilador, vários tubos de tinta, lâminas para o meu estilete, alfinetes e um cortador de pizza (sim, meus presentes são esquisitos, mas há uma explicação lógica, racional e fora do senso comum para cada um deles, acredite). Fiquei felicíssima, pois era tudo o que eu queria (sério, ver conteúdo dos parênteses anteriores), e mais feliz ainda por ter comemorado de verdade meu primeiro aniversário. Mais tarde meu irmão telefonou e conversamos bastante, terminando meu dia da melhor maneira possível.

Ter 29 anos é esquisito, pois você se sente adulta demais para estar na casa dos vinte, mas ainda precisa aguardar um ano inteiro para chegar aos trinta. É como estar em uma sala de espera. Meu irmão, no alto de seus quarenta anos, me disse para aproveitar, pois ainda estou na casa dos vinte. Porém, não posso me utilizar disso, pois o segundo dígito já denuncia que os vinte não me pertencem mais, como se eu quisesse me aproveitar de uma maquiagem com o prazo de validade vencido. No entanto, sou ainda “muito nova” para todos aqueles que já passaram dos trinta, que me consideram ainda nos vinte, até pela minha aparência.

No final das contas, chego à conclusão de que não devo prestar a menor atenção a esses dois números. Eles só dizem há quanto tempo estou neste mundo, mas não definem absolutamente nada a meu respeito. Às vezes sou jovem demais, às vezes sou mais adulta do que imaginava, transitando, como tantas pessoas, entre várias faixas etárias, em diversas situações. Temos a idade que nossa mente se propõe a ter, uma idade que não é medida em números, mas em entusiasmo, energia, alegria e paz de espírito. Uma idade que é medida em sonhos, em confiança, em esperança, em certeza, em flexibilidade, em vontade de crescer, de mudar, de melhorar, de ajudar a quem precisa.

Eu não levo mais os dramas a sério, e a vida tem sido muito mais leve, mais clara, mais fresca, como se alguém tivesse ligado o ar condicionado. Deus leva meu fardo, e o dissolve dia após dia. Cada manhã tem se aberto para mim como um mar de possibilidades, e cada novo dia é um presente. Fiz uma escolha consciente, de não me intoxicar mais com o que me fazia mal, e foi como se eu pendurasse aqueles balõezinhos coloridos dentro da minha cabeça. Sim, é estranho imaginar isso, mas foi a melhor analogia que pude fazer assim, subitamente, por mais esdúxula que pareça.

Já disse Fernando Pessoa que todas as cartas de amor são ridículas. Na verdade, a felicidade é ridícula para o mundo de hoje, que cultua o sofrimento, a tristeza, as desgraças e a desesperança, como se alimentar sentimentos negativos e uma visão negativa da vida fosse prova de inteligência, de raciocínio, de pensamento crítico e profundo. Não tenho medo algum de estender a bandeira da felicidade, por mais ridícula e que ela pareça a quem está preso ao modo acinzentado que impera em nosso mundo.

Minha felicidade é racional, serena, bem humorada, é a felicidade de alguém que já estava de saco cheio da ladainha deprimente e superficial do culto à dificuldade, à tristeza, ao carregar de pesos sobre as costas. Minha felicidade é ter, neste vinte e três de janeiro, a certeza de que, não importa quantas velas estejam sobre o bolo, a vida está apenas começando.

niver29

Originalmente publicado em 23/01/2009 no blog Maquinando.