Uma dorzinha chata na cabeça por causa dessa luz forte acesa o tempo todo. Uma dorzinha chata na nuca por causa da posição mantida por muito tempo, prestando atenção aos detalhes minúsculos. Musculatura tensionada, uma dipirona empurrada por dois goles d’água e três bolachas de leite. Eu sei que não posso comer bolachas de leite, mas como.

Meus braços andam constantemente arranhados, eu tenho a estranha mania de brincar de lutinha com os gatinhos usando as mãos. Não se deve fazer isso, mas eu faço porque gosto. Às vezes, sem querer, em uma dessas brincadeiras eles me arranham. Dia desses resolvi reparar nos braços das moças na rua. Ninguém tem esses braços arranhados…olhei para meu antebraço direito…fininho, magrinho, com veias saltadas, ossinhos aparecendo, pequenos cortes e sombras de cicatrizes de cortes anteriores. Parecia braço de drogadinha da Estrela, daquelas doidas que se automutilam com estilete. Na dobra do meu braço direito você encontrará uma pequena cicatriz de agulha de grosso calibre, deixada por doações de sangue sempre no mesmo lugar. Vários pontinhos cicatriciais de bolinhas que surgem por causa da ingestão de derivados de leite. E eu nunca havia reparado nisso.

Talvez só eu consiga ver – é bem provável – mas é estranho perceber que eu passei minha vida toda sem reparar nos braços das outras pessoas. As mocinhas (ok, eu já não sou tão mocinha assim, ano que vem faço trinta) todas que eu vi têm bracinhos lisinhos e – de preferência – com penugens douradas praticamente imperceptíveis. Aí eu me lembro que tenho de fazer o ritual de descoloração com uma certa urgência. Bracinho magrelo cheio de cicatrizes e ainda coberto de pêlos escuros não dá, né? Por outro lado, olha só a boa notícia: não me restou nem um mísero complexo da adolescência.E eles eram muitos.

Voltando aos cortes nos braços, além das brincadeiras com os gatos, também dou o sangue pelo meu trabalho. A estrutura do corpo dos noivinhos costuma ser feita em isopor, para proporcionar maior leveza à peça (e a escultura não afundar no bolo…imagina só!). O bloco de isopor é cuidadosamente esculpido na posição desejada….com um estilete de lâmina extremamente afiada. Se a lâmina não estiver afiada, o isopor começa a se esfarelar.

Ocorre que a criatura que vos escreve é excepcionalmente desastrada e consegue se cortar absolutamente TODAS as vezes em que necessita usar o tal estilete. E não apenas isso, mas sou capaz de me cortar também ao usar uma tesoura, me espetar com agulha, alfinete e até mesmo palito de dente. Má notícia: esses instrumentos são utilizados diariamente. O alicate de cutícula também já fez suas vítimas. Assim, ao lado de meu instrumental de trabalho, das massas, cola, tintas, algodão, cotonetes, lenços de papel, creme para biscuit e pote de água, um kit de primeiros socorros contendo água oxigenada, band-aid, nebacetin, dersani, soro fisiológico, gaze, descansa, placidamente, aguardando o inevitável derramamento de sangue.

Ganhei um conjunto de ferramentas de dentista (para tirar o tártaro das esculturas :-)) e acabo de notar que uma delas simplesmente desapareceu. Justamente aquela da qual estou precisando neste exato momento…e, claro, a única potencialmente perigosa: um gancho consideravelmente grande. Obviamente a tal ferramenta apenas aguarda em seu esconderijo pelo momento ideal para me atacar. Não tenho dúvidas.  Seres inanimados possuem vontade própria.

Tenho tido vontade de escrever, mas vira e mexe me pego com o maior dos problemas: gerenciamento precário de tempo. Preciso aprender a mágica do gerenciamento de tempo e me tornar uma pessoa mais organizada, para viver um pouquinho entre o trabalho e as refeições. E descobrir como raios faço para manter horários, rotina, essas coisas de gente normal.  Mas confesso que dá uma preguicite violenta de acordar cedo com esse clima fresquinho que anda fazendo por aqui. E a vida anda boa, não tenho do que reclamar. O trabalho tira meu sangue (hahaha) e toma 90% do meu tempo, mas eu gosto, me divirto, me canso, mas fico feliz. Ainda não consegui estabelecer uma rotina que comporte tudo o que eu deveria fazer além do que já estou fazendo, mas sei que é apenas uma questão de tempo (em todos os sentidos).

Tem um gato miando à minha porta. É um miado amarelo. A cabeça não dói mais, mas os olhos reclamam da luz forte. Talvez seja hora de desligar a luz, acender a luminária discreta, descansar um pouco os olhos, as costas e a cabeça, ouvindo uma música suave e acariciando um gatinho tigradinho. Eu deveria ter um horário pré-determinado para isso. Não é esquisito? A pessoa sentir necessidade de horários pré-determinados e regras? O pior é você levar quase trinta anos para descobrir que é bem diferente do que achava que era. Eu tenho necessidade de horários pré-determinados (por mim, of course) para me sentir confortável e em equilíbrio. Organização. Ordem. Seja lá quem tenha feito aquela inscrição na bandeira estava certo: ordem e progresso. Também funciona com acento: Ordem é progresso. Organização não tira a liberdade de ninguém, pelo contrário, organização confere liberdade, tempo, tranquilidade e gera energia.

Isso é por demais complexo. Guardo o assunto para um futuro post.

0 comments on Pequena pausa para escrever

  1. Alec!!!!! É você mesmo???? Olha, vai chegar, não se preocupe. Entregue para Deus e peça a Ele para trazer a pessoa certa, você merece um grande amor, meu amigo, e ele vai chegar em breve (olha eu jogando praga…risos…)

    Beijos!

    Van

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *