writer2

Escritores não são pessoas especiais ou alvos inatingíveis, hoje eu creio que qualquer pessoa pode se tornar um escritor, desde que aprenda a pensar como um escritor e, obviamente, a passar seus pensamentos por escrito como um escritor. Mas qual é o modo de pensar do escritor?

A mente de alguém que tem a literatura como atividade prioritária funciona um pouquinho diferente. O escritor observa o mundo à sua volta com atenção aos detalhes que ninguém vê. Uma folha seca presa a uma placa de trânsito pode render um texto. A folha pode representar qualquer coisa, desde a natureza até a própria pessoa que escreve ou mesmo o tempo. A placa de trânsito também pode representar qualquer coisa, desde as mais óbvias até as mais esdrúxulas.

O escritor deve ser capaz de fazer conexões lógicas entre coisas absurdas. Uma meia suja pode ter a ver com uma alga marinha, você só precisa construir uma conexão lógica entre os dois elementos. E isso é o texto literário. Isso é o despertar da criatividade. Abrir espaços. Romper conceitos pré-estabelecidos. Abrir as portas e as janelas. Costurar o ilógico com a lógica. Brincar com as palavras, procurar o humor.

O escritor observa. Observa o mundo, observa as pessoas, observa as interações, observa tudo. Não julga, a princípio, apenas observa e absorve. Ele é curioso, interessado, como um pesquisador de outro planeta. O escritor é de outro planeta.

O escritor é detalhista, ainda que seja impulsivo e hiperativo. Se não é detalhista para descrições, é detalhista para sensações e definições. Ele é detalhista para o raciocínio, para colocar no papel exatamente aquilo que quer transmitir.

 O ato de escrever é mais do que simplesmente ajeitar as sentenças no papel. As palavras pulam, conversam, discutem, dão ideias para o texto. Sentença, no texto, não é aquela dada pelo juiz, com a carga dramática de destino definitivo. Sentença, no texto, é a frase que se arranja, orgânica, com vida própria, e que nós temos que aprender a controlar, a domesticar.

Não sou partidária do texto selvagem, doido, gerado por emoções e cavalgando alucinadamente como um cavalo que fugiu do hospício. Sou fã do texto racional, que usa a emoção a seu favor, mas jamais abusa dela. O texto limpo, sem lugar-comum, evitando frescuras que tentem mostrar erudição do autor. O texto não diz respeito ao autor, mas ao leitor.

Sou entusiasta do texto que acrescenta ao leitor, jamais subtrai. O texto ladrão, pobre e infeliz, que rouba o tempo, rouba a alegria e rouba o entusiasmo merece o meu desprezo (e o seu, também). Mas as palavras que constroem, que abrem portas, implodem muros e ampliam espaços são as que realmente têm meu respeito.

São essas que encontram espaço nos leitores e fazem com que o trabalho do escritor seja realmente útil. São elas que constroem as pontes e abrem as cavernas em que nos recolhemos para escrever. São elas que fazem o escritor deixar de ser um mero repetidor de si mesmo para transmitir o que é universal e que, muitas vezes, o leitor ainda não percebeu.

E, entre todas as ferramentas que um ser humano pode ser, de construção e de desconstrução, a mais bonita delas é uma caneta. Capaz de moldar culturas, transformar sociedades, influenciar gerações, traçar caminhos, desenhar futuros. Todos temos a semente de um Escritor dentro de nós. Todos somos capazes de desenvolver essa habilidade. No entanto, por alguma razão, um esforço descomunal tem sido feito para convencer as pessoas de que escrever é algo reservado a uns poucos iluminados. Assim, aqueles que têm algo a dizer acabam com medo de dizer, pois não fazem parte dos “escolhidos” pela Pena Sagrada.

Escrever é ampliar a voz. É espalhar a voz. Não é reunir palavras ordenadas por regras, simplesmente. Não é engessá-las e reduzi-las a um amontoado de letras formais. É imprimir sentido, é entrelaçar linhas coerentes, é dizer o que se quer dizer de uma forma que os outros, que estão fora de sua cabeça, compreendam. É descobrir o outro. É entender melhor. É encontrar os óculos certos e ajudar a enxergar.

“Vai, pois, escreve isso numa tabuinha perante eles, escreve-o num livro, para que fique registrado para os dias vindouros, para sempre, perpetuamente.” Isaías 30.8

“O Senhor me respondeu e disse: escreve a visão, grava-a sobre tábuas, para que a possa ler até quem passa correndo.” Habacuque 2.2 — Se fosse hoje, acho que Deus mandaria escrever um blog. 😉

.

Para comentar, use o formulário abaixo. Para ler a política de comentários deste blog, clique aqui

8 Comments on A mente do escritor

  1. Olá, Vanessa!
    Não tem como eu pinçar cada frase que me tocou porque seria um trabalho de costureira e cá vim parar simplesmente porque estava fazendo uma pesquisa para um artigo que estou escrevendo.
    Bem, seu texto é maravilhoso. É a definição que encontro no momento.
    Obrigada por compartilhar seu olhar, nós que escrevemos tentamos capturar os instantes, instantes tão banais que se tornam grandiosos sob essas lentes míopes, mas super aumentadas.
    Que prazer reconhecer uma irmã em Cristo dentre estes tantos cultivadores da palavra. Sinto profundo respeito por quem consegue equilibrar bem a balança do intelecto com o espírito.
    A paz de Cristo!
    Um abraço!

  2. Oi Vanessa. Já faz um tempão que acompanho seus textos, por aqui, no Blog da Cristiane Cardoso e do Bp. Macedo. Mas tenho uma dúvida sobre você: Onde encontro seu testemunho, com tudo que aconteceu? Já li em vários posts que você diz que teve problemas psicológicos e até teve problemas com amnésia. Tenho curiosidade, porque você parece ter passado por problemas que se assemelham com o que acontece com o meu marido. Ele passa por problemas de depressão e pânico, além de várias outras doenças que brotam do nada, apenas pra atrapalhar a vida dele. Mas ele é um típico ‘religioso’, e por anos tentou ajuda dentro da igreja, mas nada parecia adiantar. A mente dele é muito bagunçada e ele transpira dúvidas 24 horas. É uma pessoa muito medrosa e insegura, e o pior… Ele meio que já está saturado dos discursos da igreja e nada parece fazer muita lógica pra ele. Por isso que pensei que talvez se ele visse o seu testemunho, sendo você uma pessoa inteligente e bem culta, talvez ele dê um pouco mais de crédito, porque quando alguém passa por algo que passamos, nos sentimos mais seguros. Ele não é uma pessoa orgulhosa, mas o maior problema dele sempre foi a insegurança, dúvida e medo. Por mais que ele já tenha ouvido todas as reuniões do Bispo Macedo falando sobre isso, parece que ele não consegue absorver o Espírito e se libertar.

    Desde já obrigada por ler.

  3. Boa tarde!

    “E, entre todas as ferramentas que um ser humano pode ser, de construção e de desconstrução, a mais bonita delas é uma caneta”. Amei!

    A bíblia sempre tem o versículo adequado para cada situação e essa é uma das coisas que eu mais estou gostando de acompanhar o seu blog, pois a cada post, seja ele sobre o que for, você coloca um versículo que casa direitinho com o assunto que está tratando.

    Sempre fico surpresa como você consegue achar os versículos adequados para cada post que escreve.

    Beijos!!!

  4. “Escrever é ampliar a voz. É espalhar a voz.”

    Essa frase me tocou. É realmente esse o meu objetivo quando criei o meu próprio blog em norueguês há um ano. Lá eu divido minha experiência em aprender e dominar a língua.

    Com certeza você foi de grande estímulo. O sucesso só é sucesso quando ajudamos o outro a ter sucesso também.

    Continue Vanessa! Cada texto seu inspira muita gente!
    Bjs

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *